Publicada em: 13/01/2013
“É a mesma mudança brusca que a internet causou —nova forma de fazer leitura de conteúdo que não tem volta. Não é modismo, nem coisa que vai desaparecer. O tablet, com a lousa digital, é um marco referencial do cotidiano da sala de aula”, sentencia Sérgio Ferreira do Amaral, coordenador do laboratório de inovação tecnológica aplicada na educação da Universidade de Campinas (Unicamp). Para o professor, o computador portátil em formato de prancheta e com tela sensível ao toque, representou, em 2012, a quebra com o desktop, até então visto como sinônimo de tecnologia.
Brasília, ao lado de São Paulo e Rio de Janeiro, despontou como uma das primeiras cidades brasileiras a pôr a ferramenta no ambiente escolar. Aqui, cada instituição adotou um modelo: uma foi radical, com uso obrigatório para todas as disciplinas de um segmento; outros, mais cautelosos, com restrição das atividades a uma única turma ou a uma matéria. Mesmo com as diferenças no método, elas tiveram dois resultados em comum: a satisfação dos professores e a meta de ampliar o uso em 2013.
Exemplos
Um colégio particular na Asa Sul incluiu o aparelho na lista de materiais obrigatórios do 1º ano. De acordo com o projeto, considerado pioneiro no país, todo o material didático foi preparado pelos professores, em parceria com uma editora, e colocado no tablet. Mesmo tendo que adquirir o aparelho eletrônico, o coordenador de redação, Eli Guimarães, argumenta que os preços dos e-books são competitivos com os dos livros impressos novos, que chegam a R$ 1,5 mil. Isso porque o conteúdo digital foi vendido pelo valor de R$1.111,70 (preço que não inclui a disciplina de inglês, que o aluno opta por fazer ou não na escola).
Os e-books ficam com o comprador, que pode atualizá-los por 25% do valor original — e aquele irmão mais novo poderá aproveitar o conteúdo, pagando 75% menos. Agora, em 2013, é a vez de incluir o 2º ano no projeto. Para Guimarães, o motivo foi a boa aceitação dos estudantes e a melhora no rendimento das aulas. “Como eles utilizavam o aparelho para o lazer, foi apenas a incorporação de uma prática. Houve pouca dificuldade no manuseio para estudo. O interesse em procurar, pesquisar e ler o material foi maior que no livro impresso”, aponta.
O sucesso aparece em números: a quantidade de alunos que fez as tarefas de casa foi maior, menos pais foram chamados devido a três ou mais notas dos filhos abaixo da média e a prática cotidiana de exercícios aumentou.
O único questionamento dos adolescentes foi em relação à grifagem do texto. Como muitos gostavam de sublinhar as informações mais importantes, os educadores descobriram um aplicativo em que é possível destacar os trechos, o SketchBook expert. Além disso, houve um incentivo para desenvolver novas abordagens metodológicas, como resumos, mapas, esquemas e quadros.
Em algumas disciplinas, as peculiaridades do conteúdo digital, como hipertextos, imagens e leitura mais objetiva, fizeram toda a diferença. “Em música, o professor conseguiu trazer vários sons, como piano e harpa. Em artes e história, foi vantajoso pelo componente imagético, até porque alguns referentes culturais, como Grécia e África, não têm muitas imagens. E português, porque envolve literatura, então trouxemos vídeos, depoimentos de poetas”.
Tecnologia à prova
Em um instituição particular de Taguatinga, o ano passado marcou apenas a primeira etapa do projeto de implementação dos tablets, com os alunos do 3º ano do ensino médio, na disciplina de física. Os que tinham algum aparelho móvel compraram os capítulos do livro digital, produzido também pelos professores, e os utilizaram bastante no primeiro bimestre. No três outros bimestres, foi mais em parceria com o livro impresso. Quem não quis comprar parte do e-book, recebeu a apostila equivalente.
Paralelamente a essa experimentação, os docentes preparavam o conteúdo para as outras disciplinas. “Pretendemos fazer os testes em 2013, com o 3º e 1º ano, e, em 2014, implantar de forma geral. Haverá uma pesquisa de satisfação com pais, estudantes e professores. É preciso preparar a comunidade e ver se a ferramenta realmente traz um diferencial para a aprendizagem”, explica Robert Cunha, coordenador de física.
O professor é um grande entusiasta da iniciativa e já está convencido de que o recurso é uma nova forma de aprender. “Produzimos uns vídeos no laboratório e, se o aluno vê esse vídeo antes de vir pra aula, ele já vem com outro olhar, treinado sobre o que é relevante observar. Ele ainda assiste quantas vezes quiser em casa, na hora de estudar. ”
A estudante Fernanda Queiroz, 17 anos, aprovou os novos recursos interativos: “Com as animações, você entende melhor. O professor fazia uns desenhos 3D no quadro, mas só no e-book ele é realmente 3D. Tem muita coisa que não dá para compreender na lousa”. As colegas Fernanda Sandoval, 16 anos, e Katherine Viana, 18 anos, concordam que as disciplinas que exigem muita abstração, como geometria, química e matemática, ficaram mais práticas.
Em outra escola na Asa Sul, a diretora educacional Andrea Studart Corrêa Galvão prefere não responsabilizar as diferenças no desempenho ao uso do tablet, que foi fornecido pela escola a uma única turma do 1º ano para realização de algumas tarefas. Com a intenção de ampliar para 1º e 2º ano, o foco agora será outro: trabalhar com a formação dos professores. “O equipamento não substitui o livro didático, ele apenas permite a interatividade. Percebemos que o aluno não é mais um receptor passivo e o professor é um mediador da informação. Seu papel, em sala, é transformar informação em conhecimento”, destaca Andrea.
Nesse contexto de adaptações, o especialista em tecnologias na educação Sérgio Amaral concorda que preparar os professores e desenvolver um conteúdo exclusivo é essencial. Apesar de ter recebido tanto destaque no último ano, o defensor das Tecnologias da Informação e Comunicação (Tics) reforça que o tablet é apenas um dos equipamentos móveis que podem conquistar as salas de aulas — afinal, já existem modelos de celulares que exercem funções semelhantes. Para ele, o futuro das escolas, baseado em inovação tecnológica, está bem mais próximo do que as pessoas imaginam.
Legislação polêmica
Um projeto de lei e uma lei tratam do uso de tablets em sala de aula. O primeiro, PL 4025/2012, proíbe a exigência de substituição dos livros didáticos por tablets nas instituições de ensino fundamental, médio e superior. A exceção é para os casos em que a própria escola oferece o aparelho sem nenhum ônus para o aluno. Para o deputado Márcio Marinho (PRB-BA), autor do projeto, obrigar os pais a comprarem o tablet e os livros digitais é uma medida abusiva, que atende mais o perfil consumista da sociedade que a qualidade da educação. O projeto ainda tramita na Câmara. Já a Lei nº 12.507, de 11 de outubro de 2011, prevê que os gadgets fabricados no Brasil sejam incluídos na Lei do Bem, lançada em 2005 para reduzir os impostos e baratear os computadores para o programa Computador para todos.