A dislexia é um distúrbio da linguagem caracterizado pela dificuldade de decodificar palavras simples e de aprender a ler, apesar de a criança ter inteligência normal.
O primeiro semestre letivo acabou e (mais) um boletim com notícias pouco agradáveis aterrissa nas suas mãos. Para a maioria dos pais, é como se aquela nota vermelha não se dirigisse apenas ao garotinho aparentemente pouco esforçado, mas à própria família. A reação costuma ser imediata: sermão, chantagem, castigo, além de reforços e mais reforços com professor particular. Quem está acostumado à luta para fazer o filho pegar nos livros sabe que a eficácia desse método é duvidosa. "Tudo isso equivale a combater uma febre sem tratar a origem da infecção", afirma a psicóloga e psicopedagoga paulista Nadia Bossa, autora do livro Fracasso Escolar: Um Olhar Psicopedagógico (Artmed). Mais do que um problema em si, as dificuldades na escola são, sempre, sintoma de que algo não vai bem, reflexo de outra situação. Mesmo que pareça preguiça ou distração da criança. Ainda que ela diga que não está nem aí.
"Ninguém gosta de se sentir incapaz", explica Nadia. "Muitas vezes, o ar de desinteresse nada mais é do que uma estratégia inconsciente da criança para esconder o sofrimento com as notas baixas", diz a psicopedagoga. Há dez anos, Nadia faz um levantamento com seus pequenos pacientes pedindo que representem num desenho o que é ter dificuldade na escola. "Para todos, a imagem é a de um pesadelo", revela.
O.k., sabemos então que há uma causa oculta. Mas qual é ela, afinal? Essa foi a pergunta que a relações-públicas Dulce Bellato, de São Paulo, se fez por um bom tempo até compreender o motivo pelo qual o filho, Augusto, hoje com 12 anos, se recusava a ir às aulas tão logo iniciou o processo de alfabetização. Foram infindáveis conversas com a coordenação da escola e consultas com psicólogos, sem sucesso. "Na época, nunca tinha ouvido falar que existiam transtornos de aprendizado", conta Dulce. "Só depois que encontrei uma clínica especializada veio a suspeita de dislexia, mais tarde confirmada por diagnóstico médico." A dislexia é um distúrbio da linguagem caracterizado pela dificuldade de decodificar palavras simples e de aprender a ler, apesar de a criança ter inteligência normal. Um dos sinais mais comuns é a inversão de letras ou a troca de fonemas parecidos, como q por p ou f por v.
Não há cura, mas é possível, com tratamento, contornar a situação e fazer com que a criança tenha uma vida acadêmica normal, como ocorreu com Augusto. Hoje, ele é um aluno com notas acima da média. "Ser disléxico não me atrapalha mais, não", comemora o garoto. "Sei que tem um monte de gente importante que também é, como o presidente americano George Bush."
Tarefa de Sherlock Holmes
Para Dulce, descobrir o nome do que impedia Augusto de ter um desempenho normal foi um alívio. No entanto, problemas orgânicos, como a dislexia, a discalculia, a hiperatividade, o déficit de atenção ou até mesmo pequenas deficiências visuais, auditivas e motoras são mais exceção do que regra quando se trata de dificuldades de aprendizado. "Na maioria dos casos, a origem está em algum fator emocional", afirma a psicopedagoga Silvia Amaral, do Centro de Aprendizado e Desenvolvimento, de São Paulo.
Quando vive alguma situação delicada, como a morte de alguém querido ou convivência tensa na família, é comum que a criança busque uma saída se refugiando da realidade, o que prejudica a capacidade de interagir com o mundo e de aprender, explica Nadia Bossa. Foi assim com o paulista Lucas, 12 anos. Aos 7, o menino falava tão mal que nem sequer conseguia acompanhar a 1a série. Teve que voltar para a pré-escola. "Uma psicóloga chegou a me dizer que ele era deficiente mental e que era melhor eu procurar uma escola de educação especial", lembra a mãe, a assistente social Beatriz Regis. "É claro que não me conformei." Depois do trabalho com psicopedagogos, descobriu-se que o bloqueio de Lucas vinha de problemas de família, já que os pais atravessavam um período difícil. Solucionado o mistério e feito o acompanhamento psicológico, o garoto revelou Q.I. acima da média, tem ótima dicção, adora argumentar sobre política e fala inglês e espanhol. "Foi como descobrir um novo filho", comenta Beatriz.
Chegar a um diagnóstico correto nem sempre é tarefa fácil e requer um trabalho conjunto entre a família, a escola e, em certos casos, um terapeuta. "Antes de pensar em um distúrbio específico, porém, ou de rotular a criança de portadora de alguma deficiência, os pais deveriam lançar um olhar mais crítico para a própria escola", adverte a educadora paulista Katia Smole, pesquisadora da teoria das inteligências múltiplas. "Muitos dos problemas de aprendizagem são, na verdade, problemas de ?ensinagem? ", critica. Poucas escolas estão capacitadas para lidar com as diferentes habilidades, inteligências e ritmos de cada criança. "Logo, qualquer aluno que não se encaixe no padrão esperado e que não consiga aprender no tempo que o professor determinou acaba sendo excluído, o que cria uma falsa dificuldade e é péssimo para a auto-estima", afirma Katia.
As crianças assimilam com muita rapidez idéias como "eu não sou tão bom quanto o restante da turma", "tenho dificuldade para entender o que o professor fala" ou "sou preguiçoso e não gosto de estudar" e passam a agir de acordo com essas expectativas. Quebrar esse círculo vicioso, criar um ambiente instigante, estimular a criatividade e, principalmente, a curiosidade da criança por conhecer são tarefas de ninguém menos que pais e professores. É hora de todo mundo começar a fazer a lição de casa.
Veja quais são os problemas que podem afetar o rendimento escolar.
Dislexia
Discalculia
Hiperatividade
Déficit de atenção